sexta-feira, 17 de julho de 2015

OUTROS CONTOS

«Noção de Amor», por Miguel de Unamuno.

«Noção de Amor»
O Amor/ Pintura Rupestre

564- «NOÇÃO DE AMOR»

[Excerto]

Esperar o Amor! Só o espera quem já o tem dentro de si! Julgamos abraçar-lhe a sombra e já ele, o Amor, invisível aos nossos olhos, nos abraça e nos oprime. Quando julgamos que morreu em nós, é porque já tínhamos morrido dentro dele. E logo desperta quando a dor o chama.

Porque não se ama deveras senão depois de o coração do amante se ter misturado no almofariz da angústia com o coração do ser amado. É o amor paixão partilhada, é compaixão, é dor comum. 

Vivemos dele sem nos darmos conta disso, tal como nos não damos conta de que vivemos do ar senão no momento da asfixia angustiosa. Esperar o Amor! Só espera o amor, só o chama quem já o tem dentro de si, que vive, ainda que o não saiba, do seu sangue. É a água subterrânea que aviva a secura. 

Sentimos às vezes securas abrasadoras, como as do campo deserto, que estala de sede enquanto voam à solta, à superfície, as folhas levadas pelo vento suão; e todavia, nas profundezas desse mesmo campo, por debaixo das raízes da sua verdura morta, corre sobre a rocha que a sustém, o manancial das águas do céu.

E é o rumor dessas águas profundas que se junta ao rumor das folhas secas. E há um momento em que a terra seca e sedenta se abre e brotam à sua superfície as águas adormecidas.

Assim é o Amor.

Miguel de Unamuno

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